Querido Osho,
O que dizer a respeito daqueles que tomam sannyas em Puna para depois abandoná-lo quando retornam ao ambiente de casa?
“Anand Lionel, eles são uns bundões. E eles são uns bundões, não porque abandonaram o sannyas, mas porque o tomaram. A ideia deles é de que tomando sannyas aqui, iriam ganhar algo, e depois, quando voltassem para casa, poderiam abandoná-lo.
Mas, se já existe esta ideia desde o início de que ‘eu vou abandoná-lo quando voltar para casa’, o sannyas não será uma bênção para você. Ele não pode ser uma bênção para uma mente com tamanha esperteza. Você se tornará um sannyasin, mas ainda assim, não terá se tornado um sannyasin.
Eu sei que existem pessoas, pelo menos dez por cento delas... Eu sei imediatamente quando elas vêm para tomar o sannyas – os olhos delas dizem, a vibração delas diz, todo o ser delas fede a esperteza. Mas eu respeito as pessoas, e não posso lhes dizer não. E eu penso, qual será o dano? Deixe-as brincar o jogo de ser um sannyasin. E quem sabe? Algumas vezes, as pessoas são pegas também. No começo, quando elas tomam sannyas, elas apenas querem ver do que se trata. Mas sem perceber, elas podem ser pegas no sannyas, podem ser apanhadas.
Estando aqui como sannyasins por três ou quatro meses, elas podem achar que é quase impossível abandonar o sannyas quando voltar para casa. Mas mesmo que elas o abandonem, isso é assunto delas. Elas estão sendo estúpidas. Elas estão tentando ter intimidade comigo, porque essa intimidade pode transformá-las, pode lhes dar um novo nascimento. Mas a intimidade só é possível se não existir um muro de esperteza entre você e eu. E o muro existe.
Eu lhes dou sannyas, vendo o muro, a Grande Muralha da China, entre mim e elas. Eu sei que elas não estão entrando verdadeiramente naquilo. Elas estão apenas sendo espertas. Elas não são espertas, apenas estão sendo espertas, porque uma pessoa realmente esperta não irá enganar a si mesma. E existem coisas pelas quais você pode ser imensamente beneficiado, mas apenas quando você não fica jogando.
Por exemplo, o amor pode ser uma força transformadora em sua vida. Mas se você estiver apenas representando um papel, ele não irá enriquecê-lo. Na verdade, ao contrário, ele poderá empobrecê-lo ainda mais. Se você ama uma mulher ou um homem, sem realmente amar, apenas fingindo, então você estará aprendendo algo – que o amor é fútil. Toda a sua vida pode se tornar envenenada. Toda vez que você ama, aquela esperteza estará ali, ela estará circulando em seu sangue, em seu ser. E você saberá desde o começo que tudo aquilo é um jogo. Você nunca se tornará íntimo de qualquer pessoa – e a intimidade é uma revelação. O sannyas é a intimidade suprema. Você não pode ser esperto. E se você for, estará enganando apenas a si mesmo.
Mas por que, Anand Lionel, esta questão surgiu em você? Você tomou sannyas há apenas alguns dias. A questão devia estar à espreita em algum lugar de seu inconsciente. Esta é uma questão sua, esta pode ser a sua ideia, e talvez você não esteja muito consciente dela. Você pode estar pensando que está formulando uma pergunta que diz respeito aos outros, mas os outros poderiam fazer suas próprias perguntas, você não precisa se preocupar com eles. Quem é você para estar preocupado com eles? Você já não tem as suas próprias preocupações? Mas esta questão devia estar ali em algum lugar no fundo do seu inconsciente, esta deve ser a sua estratégia. E eu ainda repito, você pode não estar consciente dela, mas o inconsciente estourou através desta questão.
Mas isto não é uma exceção. O mundo está cheio de bundões, por isto, se uns poucos bundões arrumarem um jeito de virem aqui, não será surpresa. É natural. Eu reservo dez por cento de margem para eles, dez por cento de pessoas provavelmente serão enganadoras. Na verdade, é um milagre que seja apenas dez por cento.
As pessoas têm esquecido a linguagem do compromisso, do envolvimento. As pessoas não conhecem as belezas do compromisso, elas não conhecem as alegrias da dedicação. Elas não sabem o que significa estar completamente dedicado a alguma coisa. Estar completamente dedicado a alguma coisa significa dar nascimento a uma alma em você. Isso integra você, dá a você uma coluna vertebral. De outra forma, pessoas que nunca tiveram qualquer experiência de compromisso – no amor, na confiança – elas vivem uma vida sem uma coluna, elas são invertebradas, fracas, elas são uma confusão, uma sujeira. Elas não são realmente seres humanos, ainda não alcançaram a dignidade de ser um homem.
Ser um homem significa ser comprometido, estar envolvido, estar pronto para ir até o extremo de alguma experiência. Se isto atrai você, se isto convence você, se isto converte você, então você tem que estar pronto para ir onde quer que isto o leve – até o desconhecido, até onde não há mapas. Sim, existem muitos medos, e existem muitos problemas a serem encarados e muitos desafios a serem aceitos, mas é assim que a pessoa cresce, é assim que ela amadurece.
Milhões de pessoas no mundo permanecem imaturas, infantis, pela simples razão que elas não sabem como se comprometer. Elas permanecem sem raiz. E sempre que uma árvore fica sem raiz, você pode deduzir o que lhe vai acontecer. Pouco a pouco, toda a energia irá desaparecer da árvore, porque ela já não está conectada a qualquer fonte de energia. A seiva não irá mais fluir nela, todo o seu verde será perdido, ela não ficará mais jovem e viva. Ela perderá o seu lustre, a sua grandeza, o seu brilho; ela perderá toda a sua luminosidade e não irá desabrochar. Primaveras virão e irão, mas ela permanecerá ali, morta e seca.
Isto é o que acontece a milhões de pessoas. Elas perderam seus solos. Através do sannyas, eu estou tentando lhes dar um solo que pode nutri-lo, de modo que a seiva possa começar novamente a fluir em seu sistema, de modo que a energia flua em você, e você se torne energético novamente, seja jovem novamente, cheio de juventude e frescor.
O homem perdeu uma qualidade, a do zesto (NT: entusiasmo, prazer e vivacidade). Sem isto, o que é a vida? Será apenas uma espera pela morte? Ela não poderá ser outra coisa. Somente com o zesto você vive, caso contrário, você vegeta.
Sannyas não é renúncia, é uma maneira de viver a vida em sua totalidade e intensidade. É a arte de viver a vida em todas as suas dimensões, é a maneira de viver a vida com toda a sua riqueza. Esta não é a velha ideia de sannyas. Eu não estou criando monges e freiras – não, em absoluto. Eu estou criando pessoas vivas, vibrantes, pulsantes, cheias de zesto, jovens e cheias de frescor, prontas para seguirem qualquer aventura em busca da verdade, em busca do amor, em busca de Deus.
Como você pode abandonar o sannyas? É por isto que eu digo que eles são uns bundões, não porque eles abandonaram o sannyas. Eles são uns bundões porque o tomaram. Eles não compreendem o que estão fazendo. Eles não têm consciência de onde estão se movendo. Eles não são conscientes, eles são apenas sonâmbulos, robôs, zumbis. Quando eles veem que tantas pessoas se tornaram sannyasins, a psicologia de massa deles, a mente da multidão deles, a mente de cordeiro deles, imediatamente lhe dá a ideia, ‘então, eu também tenho que me tornar um sannyasin.’
Por que? Por que se preocupar com sannyas, se isto não é uma decisão que surge no centro mais interno de seu ser? A não ser que eu tenha tocado um acorde no seu coração, a não ser que uma música tenha acontecido em você através de mim, por que se procupar com o sannyas?
Mas eles não estão tomando o sannyas comigo, eles estão tomando o sannyas com você, com outros sannyasins. Vendo tantas pessoas usando a cor laranja, todas elas felizes e alegres, eles sentem inveja. Eles se tornam, competitivos e começam a pensar que estão perdendo alguma coisa. Um sonho surge neles: ‘eu também devo conhecer o que é esse sannyas.’ Certamente eles sabem que não serão capazes de seguir todo o caminho do sannyas, mas eles dizem, eles argumentam internamente, ‘Pelo menos, enquanto estiver aqui, porque não ser um sannyasin e ter um gostinho disso? E quando voltar para casa, simplesmente me esqueço de tudo isto, assim ninguém ficará sabendo e poderei voltar novamente à velha rotina.’
É assim que a mente de massa funciona. E o sannyas não é para a mente de massa, não é para a mente de cordeiro. O sannyas é para leões.
E eu estou realmente surpreso, Anand Lionel... Parece que eu lhe dei o nome errado. Um leão formulando tal pergunta? Essa pergunta surge de uma mente muito covarde. Essa questão surge de uma mente muito esperta. E ainda assim eu repito, você pode não estar consciente disso – mas isto é ainda mais perigoso. Se você estiver consciente, algo pode ser feito.
É por isto que eu estou respondendo, para fazê-lo consciente disso. Este é um dos processos de transformação da vida: se você se torna consciente de alguma coisa você pode se livrar dela muito facilmente. Se você não estiver consciente, não há possibilidade de se livrar daquilo.
Assim, algumas vezes eu tenho mesmo que ser duro com vocês, eu tenho que ser realmente cruel, porque arrancar a verdade de seu inconsciente não é uma tarefa fácil. É uma cirurgia, e dói. E a cirurgia que eu faço, é sem anestesia, porque o inconsciente tem que se tornar consciente. Assim, enquanto eu estou falando para vocês e trazendo algumas verdades inconscientes para a sua consciência, você não pode ser levado ao sono. Se você dormir, o inconsciente nunca se tornará consciente.
Assim, esta cirurgia psicológica tem que ser feita sem qualquer anestesia. A dor tem que ser aceita. E aqueles que compreendem, lhes dão as boas vindas. E não apenas lhes dão as boas vindas, eles se sentem agradecidos por eu ter trazido para a parte consciente de sua mente alguma coisa que estava espreitando no fundo da escuridão. Agora ela pode ser deixada de lado.
Este é um milagre da consciência. Qualquer coisa que se torna consciente pode ser deixada de lado facilmente. Este é todo o segredo da psicanálise e de todas as outras psicoterapias que evoluíram a partir da psicanálise: trazer coisas do inconsciente para o consciente. Esta é toda a função do psicanalista. Uma vez que elas venham para a consciência, você por si mesmo é capaz de abandoná-las, pois quem vai querer carregar coisas feias quando se tem consciência de que elas estão ali? Mas coisas feias podem ser carregadas juntas por vidas, se você não estiver consciente.
E lembre-se, a própria consciência quer livrar-se de muitas coisas, mas você não lhe permite ter uma conversa com você. Então ela tem que encontrar maneiras indiretas. Por exemplo, num sonho ela pode comunicar alguma coisa a você, mas pela manhã você tende a esquecer.
São poucas as pessoas que se lembram de seus sonhos. Por que? É uma experiência cheia de cores e por toda a noite você fica sonhando. Das oito horas de sono, pelo menos seis você passa sonhando. E eu estou falando de pessoas normais, que não existem. E o que dizer das anormais? Elas podem arrumar um jeito de sonhar dezesseis horas em oito horas de sono. Elas podem sonhar muitos sonhos juntos, um sonho se sobrepondo a outro, um sonho dentro de outro sonho. Elas podem ter tais sonhos.
Por exemplo, você pode sonhar que está indo a um cinema e no filme você vê a si mesmo na tela indo dormir, cair no sono e sonhar que está indo a um cinema. Isso pode continuar com sonhos dentro de sonhos dentro de sonhos. Eu não estou falando de pessoas anormais. Mesmo as pessoas muito normais sonham seis horas por noite. Na verdade, esta é a maior atividade que você tem. Nenhuma outra atividade você faz por seis horas diariamente. Seis horas continuamente sonhando. E pela manhã, tudo é esquecido. Ou, por poucos segundos, você se lembra de algumas coisas, de alguns fragmentos. E logo depois você tem o seu chá na cama e tudo desaparece.
O inconsciente tenta arduamente, por seis horas todas as noites, relatar-lhe o que você está fazendo com a sua vida. Mas você não escuta. Ele tenta de outras maneiras também.
Por exemplo, esta pergunta é um esforço do inconsciente para dizer a você alguma coisa que está ali, como uma semente. O inconsciente sempre quer comunicar com o consciente. Por que? Porque o inconscente está muito sobrecarregado, muito pesado, ele quer descarregar. E como ele pode descarregar? Só existe um jeito, entrando em contato com o consciente.
Daí, Freud desenvolveu a técnica da livre associação. Ele teve que inventar o divã, porque se o paciente estiver sentado, é difícil se conectar com o inconsciente. A nossa maneira habitual de conectar com o inconsciente é nos deitando na cama, o que se tornou um hábito permanente, temos que estar no horizontal. O divã freudiano é significativo, ele ajuda o seu inconsciente a entrar em relação com o consciente.
E Freud costumava desaparecer atrás do divã, atrás de uma cortina, porque se alguém estiver presente, o inconsciente pode se sentir tímido e envergonhado, e o consciente pode distorcer e censurar. Assim, ele costumava se esconder atrás de uma tela. O paciente deitava no divã e relaxava enquanto Freud dizia: ‘Simplesmente comece a dizer qualquer coisa que vier à sua mente. Não elabore, não corrija, não tente fazer as coisas ficarem mais bonitas, sofisticadas, lógicas, significantes. Simplesmente deixe-as ser como são. Simplesmente deixe que elas saiam do jeito que são.’
As primeiras sessões não são significantes. Mas pouco a pouco o paciente vai relaxando e começa a livre associação e o inconsciente faz sua descarga.
Os psicanalistas nada fazem, além disso. Eles simplesmente ajudam você a descarregar o inconsciente. Isto faz com que coisas que tinham permanecido inconscientes por muito tempo, venham à consciência. E justamente nesse processo, as coisas começam a mudar. Um ou dois anos de psicanálise e a pessoa terá mudado enormemente, será uma pessoa totalmente diferente, mais relaxada, mais tranqüila. O que aconteceu? Pois o psicanalista nada fez, nenhum medicamento foi dado e nenhum tratamento psiquiátrico foi dado.
De fato, o verdadeiro psicanalista nem mesmo comenta, porque comentários podem se tornar perturbações. Ele simplesmente escuta, ele é apenas ouvido, e nada mais. Ele é um ouvinte silencioso e passivo, assim você pode descarregar totalmente, sem qualquer interferência.
O inconsciente tem sua própria linguagem. Ele fala por metáforas, ele usa imagens. A sua linguagem não é conceitual, a sua linguagem é pictórica. A sua linguagem é totalmente diferente daquela que você conhece.
Agora, esta é uma maneira do insconsciente. O Lionel está perguntando como se fosse uma questão de outras pessoas. Não é.
Eu ouvi: Um amigo veio visitar um casal. O pai estava muito orgulhoso de seu filho, uma garotinha de um ano e meio. Ele estava se vangloriando tanto de seu bebê que o amigo ficou interessado e quis ver a criança. O pai chamou a criança e começou a discorrer sobre sua inteligência e genialidade. E aí o bebê disse, ‘Mãe...’ O pai ficou radiante e disse ao amigo, ‘Viu, ela já falou metade da frase!’
Entendeu?
Agora, você entendeu. Levou algum tempo. A criancinha estava simplesmente dizendo ‘Mãe’, mas o pai tinha suas próprias idéias, ele estava interpretando do seu jeito.
Deixe de lado as interpretações. Pelo menos comigo, esteja completamente nu. Por que você não pode formular a pergunta: ‘Osho, se eu voltar e abandonar o sannyas, depois...’ Teria sido tão bonito, tão sincero. Mas você teve que modificar.
Você pergunta: O que dizer a respeito daqueles que tomam sannyas em Puna para depois abandoná-lo quando retornam ao ambiente de casa?
Eles nunca tomaram sannyas. Uma vez que você toma sannyas, ele não pode ser abandonado. Não se trata de algo que possa ser abandonado. Ele é um marco, é uma experiência que vai fundo dentro de você e se torna o seu próprio coração. Ele penetra você.
O sannyas não é apenas as roupas laranja e o mala. Isto é apenas simbólico. Sannyas é algo totalmente diferente, é ir muito mais fundo. Ele não está nas roupas. Uma vez que você toma o sannyas é impossível abandoná-lo – mas o X da questão é saber se você o tomou. Se você consegue abandoná-lo, isto simplesmente demonstra em primeiro lugar que você nunca o tomou. E se você não tomou o sannyas, você não será beneficiado por ele. Então, naturalmente a mente lhe dirá, ‘Qual o sentido disto? Por três meses você tem sido um sannyasin, e nada aconteceu? Por que não abandonar isto?’
E nada aconteceu porque desde o princípio você não estava nele. Você não era um participante, você estava sendo um enganador, você estava sendo diplomático.
Por favor, não seja diplomático aqui. Este é um relacionamento íntimo, por favor, não traga qualquer tipo de esperteza entre você e eu. Comigo, seja simples, inocente, e então milagres são possíveis. Você tem direito a milagres. Mas a não ser que você os permita, eles não poderão acontecer. Eles só podem acontecer com a sua cooperação.”
Osho – The Book of Wisdom – capítulo 6 – pergunta n° 2
Tradução: Sw. Bodhi Champak
Copyright © 2006 OSHO INTERNATIONAL FOUNDATION, Suiça.
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Fonte: Instituto Osho