domingo, 3 de novembro de 2013

Só Uma Pessoa Rebelde é Realmente Revolucionária






Osho,
Você pode falar mais um pouco sobre as qualidades de um rebelde? É a mesma coisa que o “novo ser humano”?








As qualidades do rebelde são multidimensionais. Primeiro, o rebelde não acredita em nada a não ser na própria experiência. A verdade de­le é sua única verdade; nenhum profeta, nenhum messias, nenhum salvador, nenhuma santa escritura, nenhuma tradição antiga pode lhe dar a verdade.

Eles podem falar sobre a verdade, podem fazer muito estardalhaço sobre a verdade, mas saber sobre a verdade não é co­nhecer a verdade. Saber sobre a verdade é o mesmo que tecer comen­tários em torno dela. Mas quem fica em torno nunca chega ao centro.

O rebelde não tem sistema de crença - crente ou ateu, hindu ou cristão. Ele é um investigador, um buscador. Mas é preciso entender algo bastante sutil: o rebelde não é um egoísta.

O egoísta também não quer pertencer a nenhuma igreja, a nenhuma ideologia, a nenhum sis­tema de crença, mas a razão para ele não querer pertencer é comple­tamente diferente da razão do rebelde. O egoísta não quer pertencer porque pensa demais em si mesmo. Ele é egocêntrico; só consegue fi­car sozinho.

O rebelde não é egoísta, é totalmente inocente. A sua descrença não é uma atitude arrogante, mas uma abordagem humilde. Ele está simplesmente dizendo, “A menos que eu encontre a minha própria verdade, todas as verdades que emprestei dos outros são como um far­do para mim, elas não vão me libertar. Posso me tornar uma pessoa instruída, mas não conhecerei nada com o meu próprio ser. Não serei testemunha de nenhuma experiência”.

O rebelde não pertence a nenhuma igreja, a nenhuma organização, porque não quer ser apenas um imitador. Ele quer permanecer puro e imaculado para que possa buscar sem nenhum preconceito, de modo que possa permanecer aberto e sem nenhuma ideia preconcebida. Mas toda a abordagem é de uma pessoa humilde.

Um rebelde respeita sua própria independência e também res­peita a independência de todas as outras pessoas. Ele respeita a sua própria divindade e respeita a divindade de todo o universo.

Todo o universo é seu templo - é por isso que ele abandonou os pequenos templos feitos pelo homem. Todo o universo são suas sagradas escri­turas - é por isso que ele abandonou todas as sagradas estruturas es­critas pelo homem. Mas não é por arrogância, é para empreender uma humilde busca. O rebelde é tão inocente quanto uma criança.

A segunda dimensão será não viver no passado, que não existe mais, e não viver no futuro, que não existe ainda, mas viver no pre­sente com a máxima consciência e espírito alerta que se possa conse­guir. Em outras palavras, viver consciente no momento. Normalmente vivemos como sonâmbulos. O rebelde tenta viver uma vida de cons­ciência. A consciência é sua religião, a consciência é sua filosofia, a consciência é seu modo de vida.

A terceira dimensão é que o rebelde não está interessado em do­minar os outros. Ele não tem avidez pelo poder, porque essa é a coisa mais feia do mundo. A avidez por poder destruiu a humanidade e não permite que ela seja mais criativa, que seja mais bela, que seja mais saudável, que seja mais inteira. E é essa avidez pelo poder que acaba le­vando aos conflitos, às competições, à inveja e finalmente às guerras.

A avidez por poder é a base de todas as guerras. Se você observar a história humana... toda a história humana não passa de uma histó­ria de guerras, do ser humano matando o ser humano. As razões mudaram, mas a mortandade continua. Parece que as razões são apenas desculpas. O fato real é que o ser humano gosta de matar.

Numa fábula de Esopo - e essas são as melhores fábulas do mun­do, muito simples e cheias de significado -, uma ovelhinha está be­bendo água de um riacho das montanhas, com água limpa e cristalina. Um leão enorme se aproxima e, naturalmente, se interessa pela ove­lha - é hora do café da manhã. Mas ele tem que encontrar uma des­culpa para o seu comportamento, então diz à ovelha, “Você está sujando o riacho. Não entende que eu sou o rei da selva?”

A pobre ovelhinha diz, “Mas Sua Alteza, estou bebendo água num trecho mais abaixo do rio, por isso, mesmo que eu suje a água, ela es­tá correndo rio abaixo - não na sua direção. O senhor está tornando- a suja e eu estou bebendo essa água. Por isso sua lógica está errada”.

O leão viu que a ovelha tinha razão e ficou com muita raiva. Dis­se, “Você não tem respeito pelos mais velhos. Está discutindo comigo”.

A pobre ovelha rebateu, “Não estou discutindo, estou simples­mente constatando um fato. O senhor pode ver para onde a água es­tá correndo”.

O leão se calou por um momento e então disse, “Agora eu me lembro. Você pertence a uma família muito pouco instruída e mal edu­cada. O seu pai me insultou ontem”.

A pobre ovelha disse, “O senhor deve estar falando de outra pes­soa, porque o meu pai morreu há três meses e o senhor deve saber que ele está na sua barriga. Ele não está mais vivo porque o senhor o almoçou. Como ele pode tê-lo desrespeitado? Ele está morto!”

Aquilo foi demais. O leão pulou sobre a ovelha e agarrou-a, di­zendo, “Você não tem modos, não conhece as regras de etiqueta, não sabe se comportar”.

A ovelha disse, “O fato é que é hora do almoço. Simplesmente me devore, não precisa inventar mais desculpas”.

Uma fábula tão simples! Esopo fez milagres. Ele disse muita coi­sa sobre o ser humano.

Um rebelde vive simplesmente no momento, com percepção, sem nenhum desejo de dominar. Ele não tem nenhuma ânsia de poder. É um cientista da alma - essa é a quarta dimensão. Assim como a ciên­cia usa a dúvida, o ceticismo, a investigação, ele usa os mesmos mé­todos para a busca interior.

A ciência os usa para a realidade objetiva, ele os usa para sua própria subjetividade. Mas ele não condena a dú­vida, não condena o ceticismo, não condena a desobediência, não con­dena uma abordagem descrente da realidade. Ele mergulha dentro do seu próprio ser com uma mente científica.

A religião do rebelde não é supersticiosa, é científica. Sua religião não é a busca de Deus, porque começar com Deus significa que você já aceitou a crença e, se aceitou a crença, a sua busca está contamina­da desde o princípio.

O rebelde penetra no seu mundo interior de olhos abertos, sem nenhuma ideia do que está procurando. Ele continua polindo sua in­teligência. Continua tornando seu silêncio mais profundo, sua medi­tação mais profunda, para que o que quer que esteja oculto dentro dele venha à superfície; mas ele não tem ideias preconcebidas sobre o que está procurando.

Ele é basicamente um agnóstico. Essa palavra tem que ser lem­brada, pois ela descreve uma das qualidades mais básicas. Existem crentes que acreditam em Deus, existem ateus que não acreditam em Deus e existem agnósticos que simplesmente dizem, “Não sabemos ainda. Vamos buscar, então vamos ver. Não podemos dizer nada an­tes de termos procurado em todos os recônditos do nosso ser”. O re­belde começa com “eu não sei”. É por isso que eu digo que ele é como uma criança pequena, inocente.

Dois garotinhos discutiam sobre a possibilidade de fugir de ca­sa. “Mas se os nossos pais nos pegarem, vão bater em nós”, disse um deles.
“Então batemos neles também”, disse o outro.
“Mas não podemos fazer isso! A Bíblia diz que temos que honrar pai e mãe.”
“Tudo bem, então eu bato no seu pai e você bate no meu.”

Uma solução simples e inocente, sem nenhuma dificuldade!

O rebelde vive uma inocência infantil, e a inocência é o mais mis­terioso dos fenômenos. Ela abre as portas de todos os segredos da vida.

Só uma pessoa rebelde é realmente revolucionária e é verdadei­ramente religiosa. Ela não cria uma organização, não cria um séqui­to, ela não cria igrejas.

Mas é possível que rebeldes possam ser companheiros de viagem; possam apreciar a companhia uns dos outros, possam gostar de dan­çar juntos, de cantar juntos, de chorar juntos, para sentir a imensidão da existência e a eternidade da vida juntos.

Eles podem se fundir num tipo de comunhão sem ter que renunciar à própria individualidade; pelo contrário, a comunhão de rebeldes fortalece a individualidade de todos, nutre a individualidade de todos, dá dignidade e respeito à in­dividualidade de todos.


Osho, em "Transformando Crises em Oportunidades: O Grande Desafio Para Criar Um Futuro Dourado Para a Humanidade"