sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Sobre o Florescimento, o Acordar, a Autorrealização e a Iluminação


Manhã de 20 de Março de 1987 no Auditório Chuang Tzu, Puna, India

AMADO OSHO,
HÁ POUCO TEMPO, VOCÊ DISSE QUE A PRIMAVERA CHEGOU E QUE MUITOS SANNYASINS ESTÃO PRONTOS PARA FLORESCER. "FLORESCIMENTO", "ACORDAR" E "AUTORREALIZAÇÃO".
TODOS SIGNIFICAM ILUMINAÇÃO, A SUPREMA VERDADE? OU HÁ UMA DIFERENÇA? E UMA PESSOA, DEPOIS DE TER ATINGIDO, PODE RECAIR NA IDENTIFICAÇÃO COM A MENTE?

"Mukto, há uma diferença entre o florescimento, o acordar a autorrealização, e a iluminação. A iluminação é a suprema verdade - o buscador desaparece, mas a verdade é encontrada. O peregrino desaparece, mas Deus é encontrado.

É importante compreender as diferenças...

Da iluminação não há nenhuma possibilidade de recaída, porque não mais existe alguém para cair de volta. Enquanto você existe, há a possibilidade. Somente a sua ausência é a garantia de que você não pode recair.

O florescimento é apenas o começo da entrada em si mesmo - exatamente como quando você entra num jardim. É imensamente importante, porque, sem entrar, você nunca alcançará o centro. Mas, no florescimento, pela primeira vez você reconhece seu potencial, sua possibilidade.

No florescimento, está o período de transição, do humano para o divino. Mas a pessoa pode cair de volta, porque o florescimento é tão novo e tão frágil e seu passado é tão velho e tão forte... - ele pode puxá-lo de volta: ele ainda existe.

Com o acordar você já está chegando muito perto do seu centro. E, à medida que você vai chegando mais perto do centro, vai se tornando cada vez mais difícil cair de volta, porque sua nova experiência está acumulando poder, força, experiência, e o velho está perdendo força. Mas o velho ainda existe: ele ainda não desapareceu. Comumente, as pessoas não caem do acordar, mas a possibilidade permanece: pode-se cair.

A autorrealização é a chegada no seu centro. Muitas religiões acreditavam que a autorrealização era o fim.

Por exemplo,o jainismo - você chegou, teria chegado à sua suprema verdade. Isso não é verdade. A autorrealização é somente uma gota que se tornou consciente, alerta, satisfeita, preenchida. É quase impossível recair da autorrealização - mas eu estou dizendo "quase" impossível, não "absolutamente" impossível, porque o si-mesmo (self) pode enganá-lo: ele pode trazer seu ego de volta.

O si-mesmo e o ego são muito parecidos. O si-mesmo é a coisa natural e o ego é o sintético; assim, acontece, às vezes, de um homem autorrealizado tornar-se um egoísta respeitoso. Seu egoísmo não vai ferir ninguém, mas certamente impede-o de cair no oceano e desaparecer completamente.

A iluminação é gota de orvalho deslizando da folha do lótus para dentro do vasto e infinito oceano. Uma vez que a gota de orvalho tenha caído no oceano, agora então, não há nenhum meio sequer de encontrá-la. A questão de retornar não existe.

A iluminação, desse modo, é a suprema verdade. O que começa no florescimento passa pelo caminho do acordar, alcança a autorrealização. Então, mais um salto quântico - o desaparecimento no eterno, no infinito.Você não mais existe, somente a existência existe.

Eu lhes contei sobre Kabir, o maior místico da Índia. Quando ele era jovem, ele tornou-se autorrealizado e escreveu um pequeno dístico:

HERAT, THERAT HE SAKHI
RAHYA, KABIR, HERAI

"Buscando e buscando e buscando, oh, meu amigo, o buscador está perdido. Buscando e buscando e buscando, o buscador está perdido."

BUND SAMANI SAMUND MEIN
SOKAT HERIJAI

"A gota de orvalho escorregou para dentro do oceano; agora, não há mais jeito de recolhê-la."

Mas, era cedo demais para dizer isso. A gota de orvalho ainda estava ali, escorregando em direção ao oceano, mas ainda não tinha caído dentro do oceano.

Quando Kabir estava morrendo, ele se tornou iluminado. Ele chamou seu filho Kamaal e lhe disse: "Eu escrevi algo errado. Naquele momento, aquele era meu sentimento - que eu tinha chegado ao supremo. Antes de morrer, escreva isto e mude aquilo.".

A mudança é muito pequena em termos, mas em experiência é tremenda. Ele usou novamente as mesmas palavras:

HERAT, HERAT HE SAKHI - "Oh, amado, buscando e buscando o buscador se perdeu.".

SAMUND SAMUND BUND MEIN

SOKAT HERIJAI - "E o oceano entrou na gota de orvalho; agora, é impossível encontrá-la.".

Uma simples diferença nas palavras... "A gota de orvalho caiu dentro do oceano" - algo do si-mesmo ainda permanece. Mas "o oceano caiu dentro da gota de orvalho"... essa é a tremenda experiencia e explosão da iluminação. A primeira afirmação era sobre a autorrealização; a segunda afirmação é sobre a iluminação.

Da iluminação, cair é simplesmente impossível. Você se foi - e se foi para sempre: nem mesmo uma sombra ou um traço de você ficou para trás.

Até a autorrealização, a possibilidade permanece - ela se torna cada vez menor, mas permance. Você pode começar a ser egoísta quanto à sua autorrealização: "Eu conheci, eu sou uma pessoa realizada. Eu sou um santo, eu encontrei Deus" - mas esse "eu" está ali, por mais respeitoso que seja. Até mesmo uma sombra é perigosa: ela pode puxá-lo de volta.

Eu ouvi contar uma história muito bela sobre Jesus...

Jesus estava andando por Jerusalém quando ele viu uma multidão raivosa gritando e xingando uma mulher. Ele se aproximou e ouviu a multidão acusando a mulher de adultério. Jesus aproximou-se em passadas largas à frente da multidão, ergueu os braços e disse: "Aquele que não tiver pecado atire a primeira pedra.".

A multidão caiu em silêncio, mas uma velha mulher adiantou-se, pegou uma enorme pedra, e atirou-a na mulher soluçante. Jesus gentilmente tomou a velha mulher pelo braço e lhe disse suavemente: "Mãe, por que você sempre me traz embaraço?".

A mãe de Jesus! Ela é uma mulher virtuosa - tão virtuosa, que deu nascimento a Jesus sem nenhum contato com um outro ser humano. Ela permanece sozinha em toda a História com essa asserção - mesmo depois do nascimento do filho - de ser a Virgem Maria.

Essa ideia deve ter se agarrado demasiadamente à mente daquela velha mulher. Sua virtude, sua respeitabilidade - Deus a tinha escolhido para ser a mãe de seu único filho - tinha se tornado um ego sutil nela. Os outros não eram tão respeitosos. No momento em que Jesus disse "a primeira pedra tem de ser atirada por aquele que é virtuoso", a multidão parou. Eles estavam todos no mesmo barco.

E você pode ver isso nos seus santos... um ego misterioso, mas muito sutil. A espiritualidade se tornou sua façanha. Alguém conseguiu todas as riquezas do mundo, outro é a pessoa mais bela; um é o mais forte, e outro é o mais santo. A questão não é aquilo com o qual o ego pode se nutrir - qualquer ideia pode fazer a pessoa cair.

A pessoa tem de continuar até que alcance o ponto onde ela não mais exista: quando não há nenhuma asserção, quando a pessoa andou o círculo todo e voltou ao mundo, simplesmente ninguém.

Talvez as pessoas nem possam reconhecê-la como um grande santo... e esta é minha compreensão: os grandes santos permaneceram sem reconhecimento, porque vocês compreendem somente a linguagem do ego. Vocês não compreendem a linguagem da ausência de ego.

O grande sábio parecerá a vocês uma pessoa comum, ninguém especial: sem nenhuma pretensão de qualquer talento, de qualquer posse, de qualquer poder, de qualquer genialidade, de qualquer conhecimento - nenhuma pretensão absolutamente.

Ele se tornou absolutamente um zero. Mas o zero não é negativo, ele é cheio da divindade, de transbordamento da divindade.".

Osho, The Hidden Splendor, #16



Fonte: Osho Sukul