sexta-feira, 19 de junho de 2015

Saiba Dizer "ADEUS"




Uma das coisas mais difíceis pro ser humano é “dizer adeus” e se despedir. Temos o hábito de guardar tudo: emoções, acontecimentos, lembranças e coisas.





Mesmo que tudo isso não tenha mais utilidade ou já tenha deixado de existir, pois temos um apego meio obsessivo pelo passado. E somos muito apegados as coisas também. Mesmo que aquilo não exista mais, nós guardamos a “imagem mental” daquilo que não está mais lá. Porque aquilo está ligado a uma emoção.

Pode ser aquele carro que você comprou com muito suor, uma coleção de discos de vinil, uma roupa ou um par de sapatos. Não importa. Esses objetos inanimados tem valor sentimental pra você.

Existe uma emoção por trás deles que você não quer largar, pois acha que se o fizer, a lembrança irá embora com eles. Não é diferente com pessoas e acontecimentos passados.

Chamamos isso de “saudade”. Justificamos, dizendo que precisamos “sentir saudade” com medo que se não o fizermos, as lembranças das pessoas e momentos nos deixarão, e nos sentiremos vazios.

Na realidade a memória das coisas que vivemos e das pessoas que conhecemos continuará, mas a qualidade do sentimento é que precisa ser alterada. Pois a saudade em forma de apego causa um sofrimento muito maior.

Ela impede que você vá em frente e que “o novo” se manifeste na sua vida. Isso causa uma baita frustração que somada a sua saudade, torna sua vida miserável.

Podem ser coisas boas ou ruins. Uma vez que você esta “apegado a emoção” de uma lembrança, ela permanece viva pra você. Tem muita gente adulta que ainda está presa a fatos de sua infância ou adolescência por exemplo.

Eu fui assim. Guardei todos os “dramas” dessas fases da vida comigo até pouco tempo. Como resultado, certas coisas não mudavam ou pareciam voltar a tona repetidamente e impediam meu crescimento pessoal também, porque eu reagia as coisas da mesma maneira que reagia quando garoto.

Ou seja, as emoções que eu vivi naquela fase da minha vida continuavam ativas e criando a minha realidade atual.

Então, quando eu me perguntava o “porquê” de certas coisas na minha vida estarem de uma certa maneira, imediatamente se iniciava um discurso mental, listando todo o sofrimento do passado, das coisas que eu deveria ter feito ou das coisas que não deram certo.

A única diferença era que aqui no presente sentia muita raiva e reagia de maneira agressiva a qualquer coisa que me remetesse ao passado. Eu continuava revivendo tudo isso, sentindo as emoções ligadas a fatos de outrora como se ainda estivesse vivendo aquilo.

Eu não havia dito “adeus” aquela fase da minha vida, em especial as coisas ruins daquele período. Da mesma forma, acontece com pessoas que passaram por nossa vida. Temos o hábito de guardar no “fundo do peito” não só os ressentimentos, mas também o amor e alegria que certas pessoas trouxeram a nossa vida.

Conheço pessoas que mesmo depois de muitos anos, choram a morte de um parente ou amigo e até de um bicho de estimação que se foi. É um grande sentimento de perda, eu sei. Todo mundo já passou por isso. Mas a negação do fato piora tudo. A pessoa se nega a dizer adeus, mesmo que isso seja inevitável.

Conheci gente que guardou objetos de pessoas queridas por anos após o desencarne. E a simples ideia de doar aqueles objetos chegava a deixar a pessoa em pânico.

Novamente, a pessoa acredita que se desfizer dos objetos, vai perder o contato com o sentimento que a mantinha ligada a pessoa. Isso ocorre também com um fim de romance ou uma grande desilusão amorosa.

Eu vivi isso também. É uma sensação de "vazio" pela falta daquela pessoa e do sentimento que de certa forma, não existe mais. Eu fiquei quase dez anos “preso” a um relacionamento passado. Eu acreditava que “por mais que tentasse não conseguiria me libertar daquilo”. Mentira.

Na verdade, eu não queria me desfazer daquele sentimento por outras razões. Eu tinha medo de me desligar e muito rancor de como as coisas tinham acabado. E com isso, eu me neguei a dizer adeus.

Como resultado, minha vida afetiva que já não era lá muito próspera, morreu. Porque quando nos prendemos ao passado, ele tende a ficar no lugar onde as coisas novas poderiam estar. E não é só isso.

Quando estamos presos a situações do passado, tendemos a repetir os mesmos padrões de outrora, pois estamos lendo as situações atuais com a mesma “lente emocional” que usávamos naquela época. Como estamos repetindo um padrão, as coisas parecem se repetir. E se você pensa que isso acontece somente na vida afetiva ou psicológica, se engana.

Podemos ter imensa dificuldade em nos despedirmos de um emprego, de uma profissão, de uma casa, de um bairro, cidade ou país. Sim, porque qualquer uma dessas coisas tem uma emoção ligada a ela. Boa ou ruim não importa. Novamente recorrerei a minha biografia:

Eu morei minha vida toda no ABC paulista. Todos os meus amigos e minhas referências de quem eu era, vieram de lá. Quem eu era, bem ou mal, era resultado da minha vivência naquele lugar. Só que um dia, depois de testar os limites das minhas crenças autodestrutivas, eu tive que me mudar pro interior de São Paulo.

Cara, foi a morte pra mim. Não bastasse eu ter perdido o emprego que eu amava (vai lá que eu ganhava mal pra burro), perder a namorada (que também não era grande coisa) e eu ainda estava “perdendo” a minha cidade. Foi um duro golpe.

Passei anos sem aceitar a mudança. Eu não me desligava do lugar, nem a pau. Passava o tempo todo comparando a cidade atual com a antiga. Ao mesmo tempo, temia em reconhecer que a cidade que eu conheci, talvez nem existisse mais.

E eu estava certo. Fiquei uns anos sem visitar minha cidade, então um dia, já com a cabeça melhor fui. E vi que além de mim, a cidade havia mudado também. Não havia mudado só plasticamente (virou um mar de prédios), mas o “ambiente” era outro, porque ela (a cidade) e eu havíamos mudado.

Então com muita calma, fui visitar os pontos aos quais eu era mais ligado. Fui ao local do meu antigo emprego que não existia mais. Visitei a rua onde morei por anos com minha família, quando meu pai ainda estava vivo.

Passei pela rua da minha ex namorada, lembrando de toda novela que envolveu meu relacionamento. Fui a casa de alguns velhos amigos, e pra terminar passei lentamente em frente da casa onde morava, e lembrei daquela manhã em que “minha vida” era colocada em um caminhão de mudanças rumo ao desconhecido.

Me despedi de tudo sem rancor, sem saudade, só fui agradecendo a tudo que vivi ali, de bom e de ruim, e deixei as emoções irem embora...Fui dormir.

Acordei no dia seguinte mais leve e com o sentimento de que um ciclo havia se fechado.
Eu consegui dizer adeus...


Renato Palhano

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